domingo, 21 de dezembro de 2008

Anjos da guarda (1)

Uma das mais típicas figuras da Ericeira, foi sem dúvida a do sinaleiro da entrada do porto.
A ele se ficou a dever ao longo dos tempos o salvamento de vidas e bens, resgatados à fúria do mar.
Os conhecimentos necessários ao exercício da sua missão, eram adquiridos através da observação do mar enbravecido, hora após hora, dia após dia e durante uma vida inteira.
Ainda está bem presente na memória dos jagozes dos anos 30, 40 e 50, a figura do sinaleiro dos mares daquele tempo.
Pescador voluntário que, quando havia embarcações ao largo, com o mar bravo, era ele que com a sua sabedoria indicava aos barcos em perigo, as escassas e apertadas oportunidades para, entre duas séries de vagalhões (andaços), demandarem a praia e "terra mãi" como diziam os pescadores da época.
Antes do aparecimento dos barcos a motor (1948), os jagozes navegavam em pequenos barcos a remos e à vela, não muito diferentes dos marinheiros da antiguidade.
Por vezes acontecia o mar enbravecer de repente com os barcos no mar (chegavam a ser 50), durando todo o dia, o trabalho heróico do sinaleiro.
Os barquitos, pequenos e lentos, demoravam uma angustiante eternidade a vencer o intervalo desde a zona da rebentação ("pancada do mar") até à praia, tendo de atravessar a forte corrente vinda da praia do Algodio, que os empurrava para a zona das rochas a sul do porto (antes da construção do molhe) e que chegou a dar origem a naufrágios e mortes.
Nesses tempos heróicos, o observador colocava-se ora no muro das arribas (camarote natural, com mais de 20 metros de altura), ora no alto do forte da Guarda Fiscal e nele se cravavam os olhos de centenas de pessoas, acompanhando os seus gestos que encaminhavam para o porto de salvação, homens e barcos.
E tudo isto se fazia sem pagamento nem subsídio, inteiramente de graça, carregando uma tremenda responsabilidade sobre os seus ombros.
Era nestas circunstâncias que se fazia sentir a acção meritória destes jagozes, verdadeiros anjos da guarda.
(baseado no livro "Os sinaleiros do mar na Ericeira" de Leandro dos Santos, 1994)

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