segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Ti Moleiro



Fernando Bonifácio da Silva Brites
"Moleiro"


Nasceu na Ericeira , em 5 de Outubro de 1925. Filho de Gregório da Silva Brites e de Maria José Bonifácio, casou em 1947 com Maria dos Santos da Silva Versos Brites, de quem teve 8 filhos, três deles pescadores; mestres Francisco, António e José Versos Brites.
A alcunha de "Moleiro" vem do facto de aos nove anos, quando ficou órfão de pai, ter ido morar com uma irmã, que era casada com um moleiro. Apesar da pouca idade, ajudava o seu cunhado no trabalho de moleiro e na distribuição da farinha, pelo que passou a ser conhecido pelo "Moleirinho".
Apesar de a alcunha nada ter a ver com o mar, iniciou aos 14 anos a sua longa vida de pescador, na Ericeira. Pertence à geração de pescadores que faz a ligação entre o velho e o novo pescador desta nossa terra.
Viveu a experiência com camaradas(1) da velha geração de pescadores, em que os barcos se deslocavam, ora a remos, ora à vela, em que tudo era muito mais difícil. Assim como durante vários anos foi mestre de embarcações já de grande porte, praticamente iguais às de hoje, equipadas com bons motores, sondas electrónicas, rádio, aladores elétricos, etc.
Hoje, apesar destas embarcações serem de maior envergadura, a vida do destemido pescador da Ericeira, não deixa de estar constantemente em perigo, não só devido ao habitual mar bravo que assola a costa ocidental portuguesa, como principalmente ao estado precário do nosso portinho. Desde 1981(2) e até há bem pouco tempo que o varadouro das nossas embarcações era feito através de uma rampa que ainda se encontra, logo pela parte sul do molhe do porto da Ericeira.


Anteriormente a esta data, os barcos atracavam na praia, como ao longo dos séculos o fizeram. Actualmente fazem-no numa pequena rampa junto ao início do pontão, que se encontra em reconstrução (uma vez mais).
Toda a distância entre "a pancada de mar"(3) e a praia era muito maior do que é hoje, além de muito mais perigosa, não só devido ao modo de deslocação e porte das embarcações, como às fortes correntes que vinham do Algodio e perto da praia a perigosa corrente que fazia no estreito entre a "lage grande" e as pedras junto ao viveiro que se encontram pela parte de terra, o chamado "Poço da Lage Grande"(4).

É durante a actividade de Fernando "Moleiro", como Sinaleiro, que os sinais através de rádio começam a ser feitos para a saída e entrada dos barcos na primeira rampa acima referida. O local onde os sinais são feitos actualmente, continua a ser o mesmo de há 100 anos atrás.
Foi através da criação em 1986, da Associação dos Armadores da Pesca Local, Costeira e Largo da Zona Oeste, com sede em Peniche, tendo como delegado na Ericeira, Joaquim Manuel Dias Leitão "Reguingas", que começou a ser dado ao Sinaleiro uma avença mensal para pagamento dos seus serviços.
A Ericeira agradece igualmente a este velho pescador, Fernando Bonifácio "Ti Moleiro", por esta nobre missão de trazer a bom porto homens e embarcações.
(1) - Termo usual na Ericeira, para definir os tripulantes de uma embarcação. É de longa data pois é conhecido desde o século XIX.
(2) - O primeiro barco a atracar nesta rampa foi o "Novo Cruzeiro" do qual era mestre o historiador ericeirense, Leandro Miguel dos Santos.
(3) - Zona onde as ondas rebentam ou se começam a desfazer. Esta zona, antes do molhe norte estar feito, ficava sensivelmente pela alturadas sete braças de profundidade (12 metros). Hoje, esta zona, não se encontra definida em virtude do assoreamento de toda esta área do porto. É conhecida pelos jovens surfistas como "o Pico".
(4) - Existe também um escolho submerso no extremo da entrada do portinho, denominado "moita" que dá origem à anticipação da ressaca, quando as vagas assaltam a praia produzindo o "estrangulamento" da entrada, especialmente quando sopram ventos do quadrante sul. A eliminação ou neutralização deste escolho tornaria mais desafogada a entrada e saída dos barcos.
A existência de um estoque de água que, partindo do poço da "lage grande", além de contrariar o movimento das embarcações que se dirigem para a praia, provoca "macaréus" que as "enxovalham" a meio do porto, o que representa outro perigo.
A construção do molhe no lado sul, tapando o poço, acabaria com tão sério contratempo, além de ao prolongar-se sobre a "lage grande", vir proporcionar um excelente apoio para operações de salvamento, também deteria o assédio das vagas sobre o porto quando há ventos do lado sul (Transcrição de um artigo sobre o porto da Ericeira publicado no "Diário de Notícias" a 4 de Janeiro de 1958, escrito por José Caré Júnior). Posteriormente a esta data, em princípios da década de 60 do século passado, este "poço" ou "estreito" foi tapado com um pequeno muro de cimento armado que se prolongava uns metros por cima da "lage grande". Mais tarde, em 1982, este mesmo muro foi prolongado e alteado tal como hoje se encontra.
(baseado no livro "Os sinaleiros do mar na Ericeira" de Leandro dos Santos, 1994)

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