quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Malha urbana até ao séc. XVIII (5)

Rua que se Encaminha para o Forte, Casal de D. Catarina

Esta rua corresponde ao que é hoje a rua de Santo António desde a capela para norte, passando pela actual travessa da Misericórdia até ao actual largo Domingos Fernandes. Encontramos alguma documentação datada do final do séc. XVII e princípio do séc. XVIII, referente a este topónimo. Toda esta área foi durante bastante tempo o "centro nevrálgico" da Ericeira. Aqui funcionou a Câmara da Ericeira ou Paços do Concelho nos terrenos ao lado da capela de Santo António (parte norte) que pertenceram à família Val-Rio. Desconhece-se se os Paços do Concelho da Ericeira funcionaram noutro local antes deste. O que se sabe é que em 11 de Junho de 1484, há uma referência aos Paços do Concelho relativa a uma audiência, "condenando" Gomes Leite, morador na Ericeira, a entregar uma pedra pertencente ao altar da Senhora de Santa Marta.
É muito possível que sejam estes os referidos Paços do Concelho, porque naquela época como já referimos, a Ericeira tinha como limites na parte sul a capela de Santo António, a nascente o largo do Oitão e a norte a actual rua do Norte e rua de Baixo.
Segundo Jaime Lobo e Silva, no ano de 1755 a Câmara já funcionava nas novas instalações junto ao Pelourinho (posto da G.N.R.). Apesar de outra referência do Mestre Jaime em que no dia 18 de Maio de 1814 foi dada de arrematação a obra da reconstrução da Casa da Câmara que havia muitos anos se achava arruinada, bem como uma outra, muito mais antiga, que servia de cadeia, localizada na calçada da Ribeira. Desta referência, podemos concluir que apesar da Câmara funcionar nas instalações junto ao Pelourinho, ainda haviam repartições que funcionavam no antigo local, nomeadamente a cadeia. Estas informações deixam-nos concluir que tanto as antigas instalações, como as mais modernas (que já eram antigas nos princípios do séc. XIX), não só estavam em mau estado, como eram insuficientes para o bom funcionamento da administração municipal daquela época.
Mais uma vez ao socorrermo-nos de Jaime Lobo e Silva, ficamos a saber que a 27 de Maio de 1815 foi inventariado o Arquivo Municipal que havia alguns anos se conservava aberto e andara por casas particulares, por ruína da antiga Casa da Câmara e que também tinha sido deliberado consultar um letrado para se saber o que conviria fazer em tal caso.
Através da investigação que temos feito à urbanização antiga da Ericeira, concluímos que pela parte norte das antigas instalações da Câmara situadas nesta rua, havia uma travessa no sentido nascente poente partindo da actual rua de Santo António até à actual travessa da calçada da Praia dos Pescadores (perto da entrada para os escritórios dos Serviços de Lotas e Vendagens), conforme podemos verificar através da planta do ano de 1897. Esta travessa, foi mais tarde ocupada parcialmente (lado nascente), como podemos verificar através da planta, pela moradia da família Vale-Rio em data anterior à sua edificação.
Nos finais do primeiro quartel do séc. XIX (1822), esta travessa era conhecida pela rua do Casal de Dona Catarina. Isto devido ao casal pertencer a Catarina de Jesus Franca, existente na parte norte desta travessa, ficando pela parte sul as instalações da Câmara. Dona Catarina foi casada com António da Costa Morgado, avós de Ana Maria Val-Rio, esposa de Luís Quaresma Val-Rio.
No princípio do séc. XX (1909), a restante parte desta travessa (lado poente), assim como os terrenos circundantes, foram adquiridos por particulares, como podemos verificar através da documentação que conseguimos localizar durante a nossa investigação. Um desses documentos diz o seguinte: "Luís Quaresma Val-Rio e Tancredo da Silva Jorge, possuidores de dois prédios urbanos mistos com frente para o largo do Forte, declaram pretender adquirir por meio de compra em hasta pública com as formalidades legais, uma porção de terreno municipal, exclusivamente para ajardinar, o qual é junto ao referido largo do Forte e confronta a norte com a rua da Misericórdia, pelo sul com a calçada da Praia, pelo nascente com os referidos prédios e pelo poente com a dita calçada da Praia e o dito forte. Foi instaurado o processo para a venda em hasta pública."
Ainda relacionado com esta rua que nos fins do séc. XVIII, princípios do séc. XIX tinha o topónimo que se Encaminha para o Forte, devemos salientar que era nesta rua que se situava o velho palácio dos morgados da Ericeira, o qual foi demolido em 1902. Era a única casa brasonada que existia na Ericeira; depois da sua destruição foi construído o casão da armação da firma Rosa & Comandita, onde actualmente funciona o armazém de madeiras e produtos de construção, pertencente aos descendentes do sr. José dos Santos Caré.
Este morgadio foi instituído como já dissemos, por João de Brito e Sousa Noronha, que o deixou em herança à sua filha ilegítima dona Juliana de Brito e Sousa Noronha, casada com o tenente-coronel de infantaria Álvaro José de Serpa Sotto-Mayor. Dona Juliana nasceu na Ericeira e faleceu no dia 16 de Dezembro de 1784. Deixou a seguinte descendência: Diogo João de Serpa e Brito Noronha, oficial de infantaria e fidalgo da Casa Real, morreu na Índia; Luís António de Serpa e Brito Noronha, casado com Maria Rita de Freitas Manuel de Aboím; Fernando José de Serpa e Brito Noronha, falecido na Ericeira a 14 de Agosto de 1807.
O senhor do morgadio da Ericeira era solteiro e estava interdito por demência, tendo sido seu herdeiro o seu mais próximo parente, o capitão-mor de Sintra, António Rufino Monteiro de Resende Cabral de Unhão e Noronha, que por sua vez deixou em herança à sua filha dona Antónia Desidéria (adiante falaremos desta senhora), casada com o Morgado da Quinta dos Chãos de Santo Isidoro, o tenente-coronel de milícias de Torres Vedras José Francisco de Assis Gorjão Barros de Carvalho, passando assim para os descendentes desta família o Morgadio da Ericeira.

Leandro Miguel dos Santos
"Toponímia Histórica da Vila da Ericeira"

(foto de João B.)

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