quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Por caminhos da Ericeira (4)

Não há nenhum observador da etnografia popular, tam instrutiva e cheia de encanto, que, nas povoações rurais, deixe de erguer os seus olhos, amorosos de arte tradicional, para esse complemento do lar doméstico, para a chaminé. São bem portuguesas essas dealbadas colunas, através das quais respira a chama que arde na paz interior da habitação. (Portugalia, II, 79).
Nesta nesga da região saloia, não aparecem aqueles modelos tam característicos doutros arredores de Lisboa, as chaminés de secção rectangular, rematadas em meio-círculo entreaberto, que talvez possam chamar-se de fenda em arco, e que tanto se encontra em Sintra, em Colares; e até, dentro de portas da capital, há raros mas curiosos exemplares (Junqueira, Rato). Desenhei umas oito.
Perpassando os seus tipos, vê-se que elas são principalmente: 1.º, tronco-cónicas, sobrepujadas por um lanternim de tejolo, rematado em cúpula mais ou menos ornada. Superior e inferiormente às estreitas frestas do lanternim, abraçam a chaminé dois estrágalos que lhe dão graça e sentimento. Por vezes as frestas fumívoras têm os tejolos em seco, outras vezes são cuidadosamente acabadas com argamassa e cal. Num exemplar que figuro, a chaminé é toda fechada até ao capêlo e, para o fumo, reservou-se quasi na base uma única e pequena fresta (1).
Além deste tipo predominante há as chaminés: 2.º, prismáticas e, 3.º, tronco-piramidais. Do 2.º há-as de secção rectangular ou quadrada. Daquele sub-tipo desenhei um elegante modelo, em que, por cada lado da chaminé, as frestas, em número de quatro contíguas, ocupam apenas o meio, deixando dos lados, isto é, nos cunhais um espaço liso. Esta chaminé termina por uma pirâmide de base quadrada, em cujas faces se abriram 4 lumieiras esguias, que reforçam a tiragem.
As chaminés do 3.º tipo são rectangulares e o remate, tanto nestas como no 1.º sub-tipo das prismáticas, é constituído por um corpo tectiforme, aberto lateralmente por frestas de tiragem ou apenas, quando côncavo, ao longo da cumieira ou aresta superior. Esta variedade é comum. O que torna curioso este coroamento, são umas pequenas peças ornamentais feitas de telha aparada à turquês e colocadas nas extremidades; desenhei-as em duas chaminés, com a forma de lancetas e de foice (2). Vejam-se as figs. 6 a 12.

 
  
 

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(1) Este curioso tipo não é um acaso, segundo penso; dum comboio em andamento, eu tomei nota de uma chaminé deste tipo, para o sul de Coimbra. O fuste era tronco-cónico, o capelo semi-ovóide, coroado por uma bola. Dispostos em losango e espaçados, mas todos de um lado, abriam-se na espessura da coluna quatro orifícios triangulares, que constituíam a totalidade da tiragem desta chaminé (fig. 13).
(2) Não tem designativo especial estes ornatos. Aos que terminam o beiral dos telhados e se erguem em curva, chamam simplesmente pontas de telhado; são de barro ou madeira.
O Archeologo Português - 1914

 
Um exemplo de chaminés típicas da Ericeira

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