terça-feira, 11 de agosto de 2009

Malha urbana até ao séc. XVIII (4)

Largo do Oitão (continuação)

Também é possível que a lenda não tenha origem em D. António, Prior do Crato, mas sim no ermitão de S. Julião, Mateus Álvares, que como sabemos ficou célebre por ter sido um dos falsos D. Sebastião, conhecido pelo rei da Ericeira e que ao contrário de D. António, foi preso.
Arrastando atrás de si algum povo da região da Ericeira, chegou mesmo a realizar o seu casamento com a filha de um rico lavrador de Rio de Mouro chamado Pedro Afonso, tendo sido coroada rainha com a coroa de Nossa Senhora. Mais tarde deu-se uma pequena batalha no vale da Senhora do Ó em que os oitocentos homens seguidores de Mateus Álvares foram derrotados numa emboscada, pelos quatrocentos soldados castelhanos bem armados.
A alguns destes homens foi-lhes dado o perdão, outros, foram lançados nos serviços forçados das galés e os restantes, entre eles Mateus Álvares, foram presos e mortos para exemplo de todo o reino, refreando algum patriotismo que o anónimo povo português nunca deixou de ter, lutando sempre contra os castelhanos.
Mateus Álvares foi enforcado em Lisboa no dia 14 de Junho de 1585, depois de lhe terem cortado a mão direita, a que tinha assinado provisões e alvarás em nome de D. Sebastião. A sua cabeça ficou durante um mês pregada na forca e foi esquartejado em quatro bocados, expostos em cada uma das "quatro portas" da cidade de Lisboa. No dia seguinte foram enforcados e esquartejados os restantes homens que sofreram a pena capital. Só na Ericeira foram enforcados vinte destes homens.
Mas também neste episódio encontramos alguma contradição relativamente ao tal rei que fora preso junto ao largo do Oitão.
Mateus Álvares não foi preso na Ericeira, segundo a Carta de Perdão dada por Filipe II que menciona que Pedro Afonso foi preso no lugar do Bombarral e o ermitão Mateus Álvares na vila de Colares. Será que também aqui o povo adulterou os acontecimentos , tendo sido preso na zona da Ericeira, não o falso rei mas sim alguns dos seus seguidores e como tal os castelhanos destruíram as suas casas, salgando em seguida o terreno onde estavam edificadas? Ou teria aí residido o ermitão Mateus Álvares? O certo é que esta lenda tenha ou não origem nestes dois acontecimentos históricos, prevaleceu viva até ao princípio do sé. XVIII.
Estes acontecimentos tiveram lugar nos finais do séc. XVI. Antes destes factos, já a Ericeira se tinha expandido para o norte através da rua do Norte e da rua de Baixo até ao princípio da actual rua Florêncio Granate e com pouca expansão para norte e nascente do largo do Oitão.
Terá sido simples coincidência ou a lenda do tal rei que viveu e foi preso junto a este largo, tem origem noutros factos históricos mais antigos, que se desconhecem? O que é certo é que só a partir dos princípios do séc. XVIII se começou a urbanizar as áreas a nascente e norte deste largo.
Leandro Miguel dos Santos
"Toponímia Histórica da Vila da Ericeira"
(foto de João B.)

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